A greve cotidiana dos alunos (Texto do Professor Erlen William Silva)

Erlem William Silva
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Professor de Física
Escola Estadual Professor José Monteiro
Colégio Dom Cabral

A greve cotidiana dos alunos

Os professores do Estado de Minas Gerais estão em greve há mais de três meses. Em Campo Belo, apenas algumas paralisações. O governo do Estado insiste em não pagar o piso, ignorando lei federal. Mas, não é sobre a pertinente greve dos professores que eu gostaria de falar. Aliás, para falar sobre o assunto, muitos outros colegas de profissão estão mais bem informados do que eu. Alguns, inclusive, têm participado das assembleias em Belo Horizonte, atentos a uma causa que também é minha.
Ao longo dos meus vinte e um anos de profissão, tenho acompanhado a crescente desvalorização do professor. Cada dia mais cobrado, cada vez menos remunerado. Cada dia mais questionado em suas atitudes e menos respeitado por governantes, alunos e por considerável parte da sociedade. Nos dias atuais, geralmente o fracasso do aluno e a baixa qualidade da educação são atribuídas ao professor. O direito e, por que não dizer, a obrigatoriedade de que toda criança e adolescente tem de estar na escola, trouxe a falsa afirmação de que todos, sem exceção, podem aprender. Até mesmo aqueles que não querem!
Mas minha intenção é falar da greve dos alunos. Greve que se arrasta ao longo dos dias, dos bimestres, do ano letivo. Alunos que sequer levam o livro didático para as aulas. Alunos que nunca (eu disse nunca) fazem as atividades propostas para casa. Alunos que faltam às aulas por motivo nenhum, às vezes perdendo provas por motivos que não se justificam. Alunos que insistem em ouvir música com seus foninhos ou “brincar” com os seus celulares, ignorando a aula do professor. Estudantes que simplesmente não estudam. Existem ainda aqueles (em menor número, felizmente) que se mostram agressivos quando são repreendidos por algum ato que não condiz com o ambiente de sala de aula. Ainda assim, mesmo depois de brincar o ano todo, ainda que tenham tirado nota zero em todas as matérias, eles têm direito de fazer o “esperado” provão de dezembro. Se não for aprovado tem o “provão de janeiro”. Se não conseguirem passar em dois conteúdos, ainda podem fazer a série seguinte com dependência. É muito fácil. Difícil é ser reprovado. Mas se engana quem pensa que não há reprovação. O índice é alto. O “provão de janeiro” é uma loucura. A grande maioria vai para a prova sem estudar, esperando o milagre da multiplicação dos pontos, que geralmente não acontece. Os números finais são desfavoráveis, as estatísticas incomodam. É época de caça aos culpados, os professores, naturalmente.
O problema da educação no Brasil é muito mais profundo do que os baixos salários dos professores. Existem muitas questões que precisam ser colocadas. A obrigatoriedade de que todos têm de frequentar escola precisa ser revista. O aluno que não quer aprender atrapalha (e muito) os que querem. A facilidade de ser aprovado, a grande quantidade de novas oportunidades que são dadas aos que não se esforçam, acaba por desmotivar os mais dedicados. A perda da autoridade do diretor e dos professores é outro fator que dificulta o dia a dia da escola.
A greve dos alunos se estende também aos pais. A cada ano que passa, eles vão ficando mais ausentes da escola. Muitos não participam das reuniões de pais e professores. Outros só vão à escola quando no final do ano vem a reprovação, normalmente para reclamar da escola.
Enfim, estamos vivendo um tempo de greve. Greve, sobretudo de valores. Hoje deixou de ser falta de educação falar ao mesmo tempo do que o outro. É normal conversar ou ouvir música enquanto o professor explica. É normal repousar a cabeça sobre a mesa e, dormir, com a justificativa de que a aula não é interessante. Mas será possível a escola ser interessante para aquele que tem certeza que não há nada a aprender?
É urgente repensar a educação, sobretudo o papel do professor. A carreira já não atrai. Alguns estão buscando outras alternativas.
Para não cometer injustiças ao terminar, gostaria de falar dos bons alunos. Não representam a maioria, infelizmente. Mas ainda existem aqueles que trazem consigo valores indispensáveis para o bom andamento das aulas. Ainda existem aqueles que correspondem às nossas expectativas, que respondem ao nosso chamado e que brilham. Aqueles que vão em busca de voos mais audaciosos sem esquecer da base que foi alicerçada nos anos de ensino fundamental e médio. É por esses alunos que buscamos motivação para desenvolver o nosso trabalho, apesar de tantos obstáculos que encontramos pelo caminho. Por eles tem valido a pena ser professor. Mas, honestamente, já não sei até quando.

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